quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

AJUSTE ECONOMICO COM CRESCIMENTO E REDUÇÃO DA DESIGUALDADE
Maria Celina Arraes[1]

Variações sobre o tema do título foram manchete no Brasil durante o Fórum Econômico Mundial, quando de notícias sobre uma sessão em que participaram o Ministro da Fazenda Henrique Meirelles e a Diretora Gerente do FMI Christine Lagarde - em que esta afirmou que a redução da desigualdade deveria ser prioridade. As manchetes procuraram apresentar um confronto direto – Lagarde contradiz Meirelles – desigualdade é prioridade - mas a leitura de várias notícias eletrônicas publicadas nos leva a interpretar que foi um debate mais elegante. No entanto o inusitado dos posicionamentos – Meirelles pelo ajuste e Lagarde redução da desigualdade - com inversão de prioridades costumeiras dá motivo para reflexão.

O mandato do Fundo foi atualizado em 2012 para cobrir todas as questões macroeconômicas e do sistema financeiro que possam ter consequências sobre a estabilidade global. Nesse sentido, já faz quatro anos que a Diretora Gerente trouxe o tema desigualdade ao Fórum de Davos, um tópico que foi um dos mais importantes no Fórum de 2017. Desigualdade pode chegar a níveis críticos que ameacem a estabilidade global, principalmente pela via política.

Não é a primeira vez que o FMI manifesta preocupação sobre o tema de ajuste com crescimento. Já nos anos oitenta, a propósito da crise da dívida externa, os países em desenvolvimento vinham defendendo em vários foros (principalmente no Grupo dos Vinte e Quatro) que, dado o tamanho do problema da dívida externa, o ajuste deveria ser de prazo mais longo e com recursos adicionais suficientes para proporcionar a manutenção de algum crescimento nas economias.[2] Para combater a desigualdade é necessário que haja mais riqueza para ser dividida, conseguida por meio de maior produtividade e crescimento sustentável de longo prazo. Ademais, como o FMI foi estabelecido para promover a cooperação internacional, a prosperidade deve ser compartilhada entre países também pelos canais usuais de comércio internacional, fluxos de capital e migrações.

Um maior crescimento obviamente ajudaria a enfrentar parte do descontentamento, como o que vemos ocorrer atualmente, com sucesso de políticos que apoiam ideias de recuperação da prosperidade perdida. Como argumentado por Benjamin Friedman, economista de Harvard, em seu livro “The Moral Consequences of Economic Growth”, sob uma perspectiva histórica, um crescimento forte, compartilhado pela maior parte dos cidadãos, costuma estar associado a maior tolerância em atitudes sobre imigrantes, pessoas desfavorecidas e fortalecimento das instituições democráticas. No curto prazo, o enfrentamento da desigualdade e do descontentamento não dispensa políticas públicas de readaptação a novas condições de emprego e de tecnologia, assim como não dispensa uma rede de proteção para os mais desfavorecidos e vulneráveis.


As pesquisas do Organismo estão unificadas sob o tema crescimento inclusivo, conforme publicado também no IMF Direct (blog do FMI) em 24 de janeiro, no sentido de que crescimento não seria sustentável sem que também traga inclusão da população:

·         Deve criar empregos para que as pessoas se sintam incluídas na sociedade
·         Homens e mulheres tenham as mesmas oportunidades de participar na economia
·         Pobres e classe média também participem da prosperidade do país
·         Crescimento seja compartilhado não somente entre a geração presente, mas também com gerações futuras, por meio de maior resiliência de um país a mudanças climáticas e desastres naturais.
·         Inclusão financeira que faz diferença nos níveis de investimento, e contribui para suavizar flutuações adversas de renda que tenham efeito sobre segurança alimentar e saúde.
·         Governança para evitar que quando um país descubra novas fontes de recursos naturais a riqueza não seja captada apenas por alguns

A retórica pelo crescimento, agora acrescida de questões de desigualdade, data de pelo menos trinta anos. A verificar se a preocupação com crescimento e redução das desigualdades se traduzirá na prática em programas de ajustamento do Organismo mais inovadores e que contemplem medidas compatíveis com o resultado advogado. Ou se apenas justificará medidas de ajuste estrutural e aumento de produtividade que já fariam parte das recomendações de qualquer maneira.
06.02.2017






[1] Consultora do PNUD para mercados inclusivos e inclusão financeira e Diretora do Banco Central (2008-2009)
[2] Veja Arraes, Maria Celina e Rocha e Silva, Olavo Cesar “ O FMI e o Ajuste com Crescimento – Mito e Realidade, no Linkedin  de Maria Celina Arraes ou no blog http://sistmonint.blogspot.com.br/

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