AJUSTE ECONOMICO COM CRESCIMENTO E
REDUÇÃO DA DESIGUALDADE
Maria Celina
Arraes[1]
Variações sobre o tema do título foram manchete no Brasil
durante o Fórum Econômico Mundial, quando de notícias sobre uma sessão em que
participaram o Ministro da Fazenda Henrique Meirelles e a Diretora Gerente do
FMI Christine Lagarde - em que esta afirmou que a redução da desigualdade
deveria ser prioridade. As manchetes procuraram apresentar um confronto direto
– Lagarde contradiz Meirelles – desigualdade é prioridade - mas a leitura de
várias notícias eletrônicas publicadas nos leva a interpretar que foi um debate
mais elegante. No entanto o inusitado dos posicionamentos – Meirelles pelo ajuste
e Lagarde redução da desigualdade - com inversão de prioridades costumeiras dá
motivo para reflexão.
O mandato do Fundo foi atualizado em 2012 para cobrir todas
as questões macroeconômicas e do sistema financeiro que possam ter
consequências sobre a estabilidade global. Nesse sentido, já faz quatro anos
que a Diretora Gerente trouxe o tema desigualdade ao Fórum de Davos, um tópico
que foi um dos mais importantes no Fórum de 2017. Desigualdade pode chegar a
níveis críticos que ameacem a estabilidade global, principalmente pela via
política.
Não é a primeira vez que o FMI manifesta preocupação sobre o tema de
ajuste com crescimento. Já nos anos oitenta, a propósito da crise da dívida
externa, os países em desenvolvimento vinham defendendo em vários foros
(principalmente no Grupo dos Vinte e Quatro) que, dado o tamanho do problema da
dívida externa, o ajuste deveria ser de prazo mais longo e com recursos
adicionais suficientes para proporcionar a manutenção de algum crescimento nas
economias.[2]
Para combater a desigualdade é necessário que haja mais riqueza para ser
dividida, conseguida por meio de maior produtividade e crescimento sustentável
de longo prazo. Ademais, como o FMI foi estabelecido para promover a cooperação
internacional, a prosperidade deve ser compartilhada entre países também pelos
canais usuais de comércio internacional, fluxos de capital e migrações.
Um maior crescimento obviamente ajudaria a enfrentar parte do
descontentamento, como o que vemos ocorrer atualmente, com sucesso de políticos
que apoiam ideias de recuperação da prosperidade perdida. Como argumentado por
Benjamin Friedman, economista de Harvard, em seu livro “The Moral
Consequences of Economic Growth”, sob uma perspectiva histórica, um
crescimento forte, compartilhado pela maior parte dos cidadãos, costuma estar associado
a maior tolerância em atitudes sobre imigrantes, pessoas desfavorecidas e
fortalecimento das instituições democráticas. No curto prazo, o enfrentamento
da desigualdade e do descontentamento não dispensa políticas públicas de
readaptação a novas condições de emprego e de tecnologia, assim como não
dispensa uma rede de proteção para os mais desfavorecidos e vulneráveis.
As pesquisas do Organismo estão unificadas sob o tema crescimento inclusivo, conforme
publicado também no IMF Direct (blog do FMI) em 24 de janeiro, no sentido de
que crescimento não seria sustentável sem que também traga inclusão da
população:
·
Deve
criar empregos para que as pessoas se sintam incluídas na sociedade
·
Homens
e mulheres tenham as mesmas oportunidades de participar na economia
·
Pobres
e classe média também participem da prosperidade do país
·
Crescimento
seja compartilhado não somente entre a geração presente, mas também com
gerações futuras, por meio de maior resiliência de um país a mudanças
climáticas e desastres naturais.
·
Inclusão
financeira que faz diferença nos níveis de investimento, e contribui para
suavizar flutuações adversas de renda que tenham efeito sobre segurança
alimentar e saúde.
·
Governança
para evitar que quando um país descubra novas fontes de recursos naturais a
riqueza não seja captada apenas por alguns
A retórica pelo crescimento, agora acrescida de questões de
desigualdade, data de pelo menos trinta anos. A verificar se a preocupação com
crescimento e redução das desigualdades se traduzirá na prática em programas de
ajustamento do Organismo mais inovadores e que contemplem medidas compatíveis
com o resultado advogado. Ou se apenas justificará medidas de ajuste estrutural
e aumento de produtividade que já fariam parte das recomendações de qualquer
maneira.
06.02.2017
[1]
Consultora do PNUD para mercados inclusivos e inclusão financeira e Diretora do
Banco Central (2008-2009)
[2]
Veja Arraes, Maria Celina e Rocha e Silva, Olavo Cesar “ O FMI e o Ajuste com
Crescimento – Mito e Realidade, no Linkedin de Maria Celina Arraes ou no blog http://sistmonint.blogspot.com.br/
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