III) AS RESTRIÇÕES À CONVERSIBILIDADE
Capítulo III de texto elaborado em 1994 quando eu trabalhava no FMI
36. A constatação de que a
conversibilidade -- ampla, geral e irrestrita -- é fenômeno recente e não muito
disseminado, torna relevante discutir os diferentes graus de conversibilidade
resultante da aplicação de restrições. Geralmente, essas restrições têm como
base quem (residentes ou não-residentes) tem direito a conversibilidade
e com qual objetivo a conversibilidade é exercida (transações correntes
ou de capital). Guitián (1993) acresce a esses dois o critério de em qual
região vale a conversibilidade.
37. As causas mais comuns de restrições à
conversibilidade foram tratadas por McKinnon (1979), segundo o qual, desde a
Segunda Guerra Mundial, três grupos de países tiveram moedas inconversíveis:
- economias centralizadas
que usam a inconversibilidade para apoiar sua
estrutura de preços domésticos e mecanismos de planejamento;
- países em
desenvolvimento, que tinham problemas fiscais e dificuldades de alinhar taxas
de câmbio; e
- países europeus, nos anos
50, por falta de reservas cambiais devido à escassez generalizada de capitais
que poderiam ser usados para compensações multilaterais.
38. Como inconversibilidade pode ser uma
questão mais de grau do que de conceitos absolutos, propõe refinar a definição de
uso comum, para distinguir três formas de inconversibilidade:
- Inconversibilidade de
bens: moeda doméstica em poder de não-residentes que não é capaz de comprar
bens e serviços aos preços domésticos[1]/;
- Inconversibilidade de
câmbio para não-residentes: as autoridades monetárias nacionais não estão
obrigadas a comprar de não-residentes saldos de sua própria moeda, com a moeda
do não-residente ou com moeda conversível, nem se permite aos não-residentes
vender no mercado seus saldos em moeda nacional; e,
- Inconversibilidade de
câmbio para residentes: quando os residentes não podem utilizar sua própria
moeda para comprar divisas para importar bens e serviços.
39. Retomando Guitián (1993), do ponto de
vista do possuidor do saldo de moedas, o autor faz uma distinção entre conversibilidade
externa e interna. Conversibilidade externa se refere à extensão na qual
não-residentes têm direito de converter saldos na moeda nacional em divisas.
Essa forma de conversibilidade é importante quando um país quer atrair
investimento estrangeiro ou empréstimos externos. Conversibilidade interna, por
outro lado, está relacionada à capacidade de residentes de converterem seus
saldos em sua própria moeda em divisas. Essa modalidade de conversibilidade
expõe a política econômica interna à competição internacional, na medida em que
os nacionais de um país são capazes de procurar a melhor aplicação para sua
poupança, inclusive no exterior.
40. Sob o ponto de vista do objetivo, o
critério básico e tradicional é diferenciar entre conversibilidade em conta
corrente e na conta de capital. O
primeiro, é o conceito mais comum, tendo sido consagrado nas diferentes versões
do Convênio Constitutivo do Fundo Monetário Internacional, como visto na seção
anterior. Refere-se ao direito a converter moeda em divisas para pagamentos de
bens e serviços adquiridos ao exterior. Conversibilidade na conta de capital
refere-se ao direito dos possuidores da moeda de convertê-la em divisas, para
pagamentos com respeito a transações na conta de capital e transferências. Essa
seria a conversibilidade inerente a liberalização dos mercados de capitais e
desregulamentação financeira.
41. Um outro critério é a região
na qual a moeda é conversível. Ao longo do tempo, países que não podiam criar
moedas conversíveis celebraram convênios com compromisso de aceitabilidade
limitada entre as moedas dos países signatários, o que podemos denominar de conversibilidade
limitada por se referir somente a determinados saldos de moeda e somente em
uma determinada região.
42. McLenaghan et alli, (1982) ao
estudarem a questão de conversibilidade na Comunidade Econômica dos Estados da
África Ocidental (ECOWAS - Economic Community of West African States),
apresentam uma definição mais específica de conversibilidade limitada. Afirmam
que conversibilidade limitada se refere à troca e ao uso irrestrito de moeda de
países dentro de uma região, como seria o caso se todos os controles e
restrições cambiais dentro da região fossem eliminados. Tal conversibilidade
envolveria um "acordo de conversibilidade", em que os países poderiam
determinar seus sistemas de câmbio livremente.
43. O conceito de conversibilidade
adotado pelo Secretariado da UNCTAD (1987), em relatório de avaliação e opções
de política para mecanismos de compensação e pagamentos entre países em
desenvolvimento é o mesmo conceito de conversibilidade de McLenaghan.
Afirma-se, entretanto, que o sentido de conversibilidade limitada proposto pela
UNCTAD à Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental é restrito ao
estabelecimento das chamadas "contas de conversibilidade", em bancos
da região, e denominadas na moeda do país onde o banco está localizado. Os
recursos seriam originários de receita de exportação para aquele país e
poderiam, por sua vez, ser utilizados para o pagamento de importações
originadas daquele país, assim com outros pagamentos devidos.
44. No caso da América Latina, diversas
foram as iniciativas de se dotarem as moedas da região de um certo grau de
conversibilidade. Por exemplo, em 1961, foi criada a Câmara de Compensação
Centro-Americana. Posteriormente, foi estabelecido o Convênio de Créditos
Recíprocos da ALADI, primeiro como um sistema de contas bilaterais e depois com
a liquidação multilateral dos saldos por um banco agente. Nos anos oitenta
foram criados o Fundo Andino de Reservas e o peso andino. Quanto ao MERCOSUL,
enquanto não se atinge a integração monetária completa com ausência de
restrições e fixação de paridades, várias medidas foram tomadas visando a
aumentar o grau de conversibilidade da moeda brasileira na região do MERCOSUL [2]/.
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